30 de jul. de 2011

Contos de um taxista amador


Enfim, férias. O que pra muitos é sinônimo de descanso, não se aplica a mim. Minha mãe é vendedora e, mesmo tendo carteira, não dirige. Então, aproveitando-se do meu tempo livre, me usa como taxista-escravo-exclusivo e me faz levá-la, com suas mercadorias, pra fazer suas vendas.
Numa das minhas primeiras missões, levei-a a um bairro próximo. Desceu, pegou as coisas dela e disse que “voltava já”. Eu sabia que não era tão “já” assim, e me precavi levando um disco duplo d’Os Mutantes. Inclinei um pouco a poltrona e pus-me a observar a rua.
Lá pro fim do primeiro disco, quase uma hora depois de chegar, uns molecotes armaram umas “traves” na rua, eram dois pares de chinelos, com distância de cerca de três passos um do outro, bem em frente ao carro. Um maracanã sobre o asfalto. Começava uma partida de furingo, um bate bola interrompido o tempo inteiro pelos carros que por ali passavam. A garotada era dessa típica garotada de conto infantil, que não sabe andar, só sabe correr, de short e – olhe lá – camiseta. Aquela partida de futebol sobre o duro chão negro passava despercebida pelos olhos de quem estava fora do jogo, mas deveria florir a imaginação daqueles guris. Cada jogada devia gerar comparações descabidas e desproporcionais com quaisquer ídolos de qualquer um que ali jogava. Cada gol deve ter rendido um sonho à noite, de estádios cheios gritando seu nome. Quando, na verdade, ele só passou a bola entre os dois chinelos no meio da rua. Crianças, crianças, vocês não sabem a inveja que me causam.
O jogo estava corrido. O time que defendia a trave-chinelo-azul saiu ganhando, fez dois gols. Logo depois o time que defendia a trave-chinelo-verde reagiu, fez um gol, depois outro, e vinha pra cima pra conseguir a virada, quando o jogo teve que parar. Minha mãe chegou e eu tive que sair com o carro. Já estava na terceira música do segundo disco. Mamãe pediu pressa, ainda tinha que passar na padaria. E o jogo, ah, o jogo eu não soube de quanto terminou.

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